RESENHA: O segredo dos Corpos Dr. Vincent Di Maio e Ron Francell
- Raul Silva
- 1 de jan. de 2019
- 4 min de leitura
Atualizado: 29 de dez. de 2024
Sabe quando você se depara com um texto que aparentemente foi exagerado para se tornar mais dramático ao leitor? Pois é o que acontece aqui, os relatos são muito interessantes, mas às vezes, parece que estou lendo o roteiro de uma série de TV e não o relato de um médico patologista sobre um caso real.
Não que o livro seja de todo ruim, afinal, é preciso tornar o texto “entendível” para leigos da patologia forense e esse é sem dúvida um dos pontos fortes do livro. Contudo, muitas vezes, parece exagerado demais e o texto fica mais parecido com um documentário sensacionalista do Discovery do que com um livro com histórias reais. O autor, ou autores, acabam por sua vez, ganhando pontos com o leitor por escolherem uma forma simples de contar as histórias, fazendo uso vários paralelos com outros casos famosos e de grande repercussão na construção do texto. O que faz com que o livro acabe se saindo bem mais narrativo do que eu pensei que seria a primeira vista.
A narrativa começa com um caso de assassinato de um jovem rapaz negro que foi morto por um homem branco, o que acaba gerando uma grande repercussão nos EUA, principalmente com questões sobre as armas e a luta pelos direitos civis da comunidade afro-americana e termina com um polêmica envolvendo a morte de Vincent Van Gogh. O panorama dos casos é traçado de uma maneira bastante “romantizada”, a única coisa que realmente leva o leitor a ter um frio na barriga é o fato de estes casos serem reais. O livro, na verdade, lembra bastante aqueles documentários do History Channel sobre crimes bárbaros ou perseguições históricas a seriais killers.
O Dr. Di Maio adota uma mesma fórmula ao longo de todo o livro: explana a partir do crime e do que aconteceu, passando pelo ocorrido no dia do crime, pela história da vítima – ou vítimas – e todos os envolvidos no caso, até como a mídia influencia as pessoas com suas próprias deliberações que não vão além do que se diz sobre o que aconteceu, muitas vezes sem examinar os fatos, formando “detetives/investigadores de poltrona” como o próprio autor chama as pessoas que emitem opiniões sobre assuntos que não compreendem ou não têm conhecimento suficiente para compreender. A partir disso ele discorre sobre os aspectos forenses do caso e explica como chegou as conclusões sobre o ocorrido através dos métodos científicos, sempre salientando a imparcialidade da ciência e do perito forense.
A forma de expor os casos é muito interessante e visa a total compreensão do leitor, de modo que, apesar de ser um livro meio técnico sobre crimes, investigação e patologia forense, é muito simples entender como funcionam as investigações e como ocorreram os crimes. Porém, apesar de ser bastante fluído, o livro peca com repetições desnecessárias de informação. Por exemplo, os autores deixam bem claro, o tempo todo, que têm segurança naquilo que estão dizendo e que dominam o assunto. Porém, ficar reafirmando inúmeras vezes o compromisso que têm com a verdade das provas, meio que da margem a algumas interpretações como a de que dizem isso apenas pra se resguardar de processos futuros ou que na verdade estão mais preocupados com suas carreiras, não com os casos, e que dizem isso apenas na tentativa de convencer o leitor a não pensar o contrário. No final eu fiquei meio na dúvida se deveria ou não acreditar no que dizem. O livro, por fim, acaba se transformando em um documento de defesa ao trabalho do patologista forense, que na visão dos autores é baste mal visto pela comunidade médica e muitas vezes mal compreendido pela comunidade jurídica.
Outro aspecto que me deixa com a pulga atrás da orelha, é a tendência do Dr. Vincent di Maio parecer ser meio arrogante e cheio de si em alguns trechos. A impressão que fica é de como se o trabalho de outros nunca fosse tão bom quanto o dele. Não sei se isso se deve a tradução do texto ou a escrita do coautor Ron Francell, mas essa é a sensação que tive em muitas partes do livro. Porém, em outros momentos, o mesmo também se revela bastante humano e emotivo em relação aos aspectos do caso e das pessoas envolvidas. Dessa forma, não consegui formar uma opinião a respeito dele.
No final, o que posso dizer com certeza é que o livro nos dá um novo olhar sobre o trabalho do patologista forense que, em algumas ocasiões, é retratado como um esquisitão que aparenta ter um fetiche com a morte e em outras como um super-herói que precisa resolver sozinho o quebra-cabeça com suas ferramentas tecnológicas de alto nível, por que os outros são incapazes disso. Nesse ponto, os autores foram eficientemente capazes de nos mostrar a verdadeira face desse trabalho, suas principais dificuldades longe das soluções milagrosas das séries de TV, mostrando que nem tudo é como pinta CSI.
Raul G. M. Silva.
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